Cabral descobriu o Brasil no caminho pras Índias. É isso que nos contam na escola. Mas, na verdade, ele seguiu tão cegamente o GPS da nau dele que nem percebeu que a ordem era “vire à direita no Oceano Índico” e não “Vire à direita no Oceano Atlântico”. Pegou a saída errada e bateu cá, no caribe baiano.
Chegou aqui todo prosa, com roupas pesadas e plumas, comendo charque estragado e arrotando Pasteizinhos de Belém pra cima dos nativos, que também eram todos orgulhosos, com bilaus de fora, comendo mandioca e arrotando carne de Paca.
Gostou do lugar e resolveu ficar, arranjou uma índia pra cuidar dele, tirou o chapéu de capitão e abriu uma casa de sucos e açaí. Também deixou crescer uns dreads, virou mestre capoeirista e andava de meias na praia pois não gostava da areia entre os dedos.
Depois de um bom tempo, num rompante de lucidez, lembrou que tinha que relatar a viagem e o “achado” pra seus patrocinadores: o rei da Espanha e a Apple. Pegou o primeiro barco e se pirulitou pra Europa, onde maquiou um pouco a descoberta, pra parecer mais heróico e pra tentar evitar o turismo de massa dos gringos nos nordeste.
Não adiantou muito.
Pouco depois, hordas de ônibus, transatlânticos e turistas estavam desembarcando em Porto Seguro pra comemorarem a formatura.
Enquanto Cabral ia pra Europa, fazer a prestação de contas com o Rei da Espanha, Pero Vaz de Caminha ficou administrando a vila e a sua Peixaria. Mas o Caminha gostava mesmo era de escrever e ler literatura. Escamas e entranhas de peixes não eram sua paixão.
Resolveu então, numa sexta de Carnaval, sair pelas ruas de Salvador numa carroça, recitando Camões e Paulo Coelho. No primeiro dia o Sarau Ambulante foi um sucesso, varias pessoas seguiam a carroça recitando em voz alta os trechos mais famosos:
“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o Mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.”
Tiveram até que demarcar com fitas e seguranças, quem podia ficar logo atrás da carroça (onde dava pra ouvir melhor o Caminha) e que ficava mais pra trás, onde não se ouvia muita coisa, mas a festa era mais animada.
No segundo dia, pra atrair mais pessoas, o Caminha chamou uma galera que tocava tambores no ritmo dos decassílabos de Os Lusíadas. Foi um blockbuster instantâneo. Mas não pelos versos ou pela capacidade de recitar do Caminha, e sim pelo ritmo.
Pouco a pouco os tambores foram tomando a frente da carroça e relegando o Pero Vaz à função de cocheiro.
De repente tinha até um berimbau e uma sanfona acompanhando os tambores. Vararam a madrugada a caminhar pela Praça Castro Alves ouvindo a música.
Pero Vaz, pra tentar acabar com o mafuá que tinha virado o seu Sarau Literário, voltou correndo pra peixaria, pegou umas enguias elétricas gordas e tentou espantar o povo no choque. Pra desespero dele, isso só os fez ficarem mais alucinados e acordados. Tentou então eletrocutar os músicos, jogando enguias neles. Não deu certo, só fez o volume aumentar.
E assim nasceu o Trio Elétrico, como ficou conhecida a bandinha eletrocutada por Caminha, composta por uns gringos que ali aportaram para a bagunça: Noel Redding, Mitch Mitchell e um tal Jimi Hendrix.